palavras
Para o sétimo círculo do Inferno,
faltando dois para se estar no último,
Dante manda os blasfemadores.
Dante manda os blasfemadores,
faltando dois círculos para o último,
para o Inferno — sétimo círculo.
Pecaram pior do que
luxuriosos, gulosos, gananciosos, irados e heresiarcas.
Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete:
oitavo e logo o nono.
Observo-os daqui do Limbo
e os admiro (talvez por terem crido
peremptoriamente — em Deus).
E escrevo logo, porque logo
meus versos caem direto ao último — nono círculo.
meu último livro
Meu último livro de versos, assumo, foi feito pra ti,
e não nego, pra ti também servem estes versos aqui.
Tudo mudou desde então, sabemos muito bem.
Só não mudou a influência dos astros em tudo que fala.
Os girassóis agora preferem, desoladamente, contemplar o luar.
E o próximo livro não vem.
après moi, moinho.
sábado, 30 de maio de 2015
sexta-feira, 6 de junho de 2014
seis e uns quebrados
seis e uns quebrados
não há nada além do correr dos ponteiros
além do barulho assustador do tic-tac
do vermelho vivo sangue do relógio
pendurado no alto de uma parede de azulejos
que se completam num padrão tão bonito
em algo tão sólido e difícil de penetrar
quando se lembra que não há nada além
além dos gritos cortantes por socorro
confusão espacial das sirenes dos bombeiros
nada além do frio do silêncio do vazio
nada além do correr ainda dos ponteiros
é aí que a noção de tudo se esvai e volta
tic
tac
não há nada além do correr dos ponteiros
além do barulho assustador do tic-tac
do vermelho vivo sangue do relógio
pendurado no alto de uma parede de azulejos
que se completam num padrão tão bonito
em algo tão sólido e difícil de penetrar
quando se lembra que não há nada além
além dos gritos cortantes por socorro
confusão espacial das sirenes dos bombeiros
nada além do frio do silêncio do vazio
nada além do correr ainda dos ponteiros
é aí que a noção de tudo se esvai e volta
tic
tac
quinta-feira, 22 de maio de 2014
vinte e dois de maio de dois mil e catorze.
medo
e os gatos
mortos pela Inquisição
não conseguiram evitar
a peste que devastou
toda Europa.
*
hoje faz um dia bom
pra quebrar um ukulele
na cabeça do Joseph Blatter
hoje faz um dia bom
pra tomar leite da garrafa
fora da data de validade
hoje faz um dia bom
pra pegar ônibus nenhum
e dormir a tarde toda
hoje faz um dia bom
pra anunciar uma revolta
(armar idosos com granadas, coisa e tal)
hoje faz um dia bom
pra pagar pelo que é teu
sem reclamar ou fazer cara feia
hoje faz um dia bom
pra encher a cara de cachaça
o peito de coragem e
desistir sentar
e esperar
hoje faz um dia bom
mentira
não faz não
e os gatos
mortos pela Inquisição
não conseguiram evitar
a peste que devastou
toda Europa.
*
hoje faz um dia bom
pra quebrar um ukulele
na cabeça do Joseph Blatter
hoje faz um dia bom
pra tomar leite da garrafa
fora da data de validade
hoje faz um dia bom
pra pegar ônibus nenhum
e dormir a tarde toda
hoje faz um dia bom
pra anunciar uma revolta
(armar idosos com granadas, coisa e tal)
hoje faz um dia bom
pra pagar pelo que é teu
sem reclamar ou fazer cara feia
hoje faz um dia bom
pra encher a cara de cachaça
o peito de coragem e
desistir sentar
e esperar
hoje faz um dia bom
mentira
não faz não
quarta-feira, 30 de abril de 2014
nota introdutória
nota introdutória
escrevi dispersodispensei a arte
fiz o inverso
e cobrei só metade
meu pescoço dói
capotei e dormi só que de lado
não levem a sério
ainda estou sendo alfabetizado
segunda-feira, 28 de abril de 2014
passo
passo
passo passo passo passopasso passo passo passo
como posso apressado
pensar tanto em te ver
passo logo por sua porta
e sozinho me encontro
meio turvo passo oco
passo assim e passo sonso
e de novo o passo avança
e mais passo descabelo
mas de novo mais um passo
e atrás ficou o passado
que eu deixei pelos espaços
que me trazem até aqui
passo passo
passo passo
enquanto caço aventuras
passo por um palacete
em que o palhaço que saltou
suicidou-se sem querer
e passo passo passo passo
passo passo
passo passo
aconteceu
aconteceu
aquela voz que passa pelo ouvidocomo as nuvens passam pela Lua
aquela voz que passa para o olvido
como um dia sem crianças na rua
aquele muro que ergueram em segredo
logo que veio de repente o medo
aquela luz que vacilou por segundos
como se com o vento a energia falhasse
aquele instante em que surgiu uma sombra
de um avião que por segundos passava
aquele mês em que o circo partiu
e todo mundo entristeceu, num impasse
sábado, 19 de abril de 2014
maio
maio
em maio todos ficam doentes.
corpos que se espremem no canto de
salas de aula
escritórios
bares
e que, de vez em quando,
percorrem todo o caminho
se esgueirando pelo ar
até chegar ao banheiro,
pegar papel, assuar o nariz,
lavar a cara, o nariz,
assuar o nariz de novo,
fazer uma careta para o espelho
e voltar, num caminho tortuoso
até onde estavam
corpos que se escondem
debaixo de cobertores nos finais de semana,
tentando ler — não conseguindo
e se entretendo
na mais pós-moderna representação da volúpia do aborrecimento:
a música indie-deprê
as janelas estão sempre ocupadas.
as luzes faiscantes dos carros
entretêm esses corpos que se submetem
ao vento gelado da madrugada por
falta do que
querer fazer.
nunca se toma tanto café.
nunca se fuma tanto cigarro.
a desatenção só proporciona
a leitura da poesia
(as piores leituras possíveis)
mas da poesia curta
da poesia de uma estrofe só.
nesse começo de frio,
de maio,
não conseguimos acreditar
que esses corpos molengas abrigam pessoas.
não queremos acreditar
dá um pouco de pena.
mas o corpo é superestimado.
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